A total ausência de transparência e informações sobre os gastos com contratos e licitações feitos pela Prefeitura de Anamã, administrada por Chico do Belo (PSC), virou alvo de uma representação admitida pelo presidente do Tribunal de Contas do Amazonas (TCE-AM), Mário de Mello, na última segunda-feira (2). Segundo a denúncia, há mais de um ano o Executivo Municipal não publica no Diário Oficial dos Municípios os processos licitatórios e nem contratos realizados pela atual gestão.
A denúncia sustenta que nesse período foram feitas quase 300 publicações da prefeitura no site, todavia, nenhuma referente às contratações e licitações. Também mostra que na pasta de Anamã no Portal de acesso à informação e Transparência dos Municípios do Amazonas não há atualização dos atos de Chico do Belo no primeiro semestre de 2021.
“O que evidencia o desrespeito desta prefeitura com o contribuinte, chegando a publicar em março deste ano informações atrasadas de um contrato firmado em 2020”, diz trecho da representação aceita no Tribunal de Contas.
De acordo com o documento, além da demora na divulgação, o termo de contrato nº001/2020 ainda é passível de questionamentos. Entre eles, a contratação de uma empresa de material de construção para fornecer passagens fluviais e o serviço de fretamento a fim de atender as secretarias municipais.
Com esse contrato, Chico do Belo está pagando o valor global de R$ 832 mil do bolso dos moradores de Anamã. A garantia foi dada por uma Ata de Registro de Preço, válida por 12 meses. O contrato foi assinado pelo prefeito em fevereiro de 2020, porém a sua publicidade só apareceu mais de um ano depois, em março de 2021.
‘Empresa faz tudo’
O Portal AM1 constatou no site da Receita Federal que a empresa N E M COMERCIO DE MATERIAIS E SERVIÇOS DE MAO DE OBRAS LTDA de CNPJ Nº 19.010.995/0001-08 tem sede no bairro Parque 10, em Manaus. Com o nome fantasia de ‘Souza Comércio e Serviços’, ela tem como atividade econômica principal o ‘comércio de materiais de construção’ em geral e outras 47 secundárias.
Ainda segundo o site, a empresa tem capital social de R$ 2,5 milhões e possui apenas uma proprietária, identificada como Nara Souza de Souza.
Cabide de emprego
A representação admitida pelo presidente do TCE pede que a Corte de Contas questione as razões pela falta de publicidade dos atos da Prefeitura de Anamã que deveriam ser públicos. A denúncia destaca, ainda, que além de omissa, a administração de Chico do Belo emprega parentes no Executivo Municipal, transformando Anamã em um cabide de emprego para filhos, irmãos, primos e sobrinhos.
Vale ressaltar que o prefeito agraciou o filho, Ruam Bastos com cargo de chefia na Prefeitura de Anamã. Ele atua como secretário Municipal de Economias e Finanças, além de ser responsável pelas Contas do Fundo Municipal de Assistência Social e de Saúde de Anamã.
E por “dar de presente” duas secretarias municipais ao filho, Chico do Belo foi denunciado por improbidade administrativa no ano passado pelo Ministério Público. Ele foi acusado de nepotismo e alvo de pedido de suspensão dos direitos políticos por até cinco anos.
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No documento, o promotor de Justiça Klepter Antony Neto destaca que, além de ser parente do prefeito, o secretário não possui qualquer qualificação para o exercício dos cargos públicos.
“A eventual alegação de que os cargos de secretário municipal possuem natureza de cargos políticos e que, portanto, não estariam submetidos à Súmula Vinculante n.º 13, também não pode ser acolhida no caso concreto. Ainda que assim não se entendesse, o que somente se admite por amor ao debate, em julgados recentes – mesmo para cargos de natureza política – entende-se haver a necessidade de demonstração de capacidade técnica do nomeado”, explica o promotor.
Para o representante do MP, as nomeações irregulares de Ruam Bastos tiveram clara intenção de privilegiá-lo, infringindo os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, isonomia e eficiência, gerando seu enriquecimento ilícito.
Tudo em família
Após denúncia envolvendo o filho, o Portal AM1 recebeu, em março deste ano, novas acusações e indícios de que, pelo menos, outros três parentes de Chico do Belo trabalham na Prefeitura de Anamã. A lista inclui sobrinha e primos; confira quem são eles:
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O prefeito Chico do Belo também conseguiu eleger até um parente para Câmara Municipal de Anamã nas últimas eleições. No entanto, a vereadora eleita Jessica Conegundes está sendo alvo de um pedido de cassação do Ministério Público Eleitoral. Segundo o órgão, os indícios apontam que ela é nora do prefeito, sendo companheira de Ruam Bastos. Tal situação é proibida conforme a Constituição Federal.
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A denúncia afirma que Jéssica se auto classificou como ‘solteira’ no registro de candidatura, mas convive em união estável com Ruam desde 2013, o que é confirmado pelo mesmo endereço da residência. Além disso, o MP usa postagens nas redes sociais para comprovar o nível de proximidade e, de fato, parentesco entre os três.
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A vereadora nega que tenha união estável com Ruam Bastos, e diz que são “apenas” namorados, a fim de se manter na Câmara Municipal de Anamã. A defesa afirma que o fato de ambos terem declarado que estão em um “relacionamento sério”, não autoriza a imediata conclusão de que vivem em uma união estável.
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A versão é contestada pelo promotor que refuta a declaração da defesa da vereadora ao tratar a relação como mero namoro. “O MP entende que existe sim relação estável entre eles, com base em todos os argumentos expostos nos autos e mantém o entendimento apresentado no recurso sobre a inelegibilidade”, afirmou Kleper Antony Neto ao Portal AM1.
No mês passado, a Justiça eleitoral realizou a audiência com Jéssica sobre o processo de inelegibilidade. Segundo informações, o prefeito Chico do Belo e o filho Ruam Bastos, apontado como marido da vereadora Jessica, faltaram no depoimento.
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A parlamentar ainda tentou fugir do depoimento, mas teve o pedido de não depor na audiência virtual negado pelo desembargador eleitoral Luís Felipe Avelino Medina. Na ocasião, a defesa alegou que a vereadora encontra-se na iminência de sofrer risco à liberdade de locomoção.
O processo sob a relatoria do desembargador eleitoral Marco Antônio Pinto da Costa já está em na fase das alegações finais. Nos bastidores a cassação do diploma da nora do prefeito de Anamã é dada como certa.