| KLEITON RENZO – DO RDA
A proposta do deputado evangélico estadual João Luiz, do Republicanos, que institui a campanha “Deus é Luz e Nele não há trevas!” no Amazonas, levanta sérias e preocupantes questões. A medida, que incentiva a substituição da celebração do Halloween em escolas por uma promoção de princípios e valores baseados na palavra de Deus, suscita dúvidas quanto ao respeito pela pluralidade religiosa e à separação entre o Estado e as diversas manifestações de fé.
O Projeto de Lei N. 711/2024 começou a tramitar nesta quinta-feira (7) na pauta da Assembleia Legislativa do Amazonas (ALE-AM) e passará pelo crivo dos demais deputados antes de seguir para votação em plenário e posterior veto ou sanção pelo governador Wilson Lima (UB).
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Por mais que o deputado tenha grifado no corpo da justificativa do projeto que não “não visa a proibição do halloween”, na prática, a referida proposta, se aprovada e tornando-se Lei Estadual, o fará.
De acordo com o texto, “o incentivo a substituição da comemoração alusiva dos dias das bruxas (Halloween)
comemorado em outubro, em especial no dia 31 do referido mês” será feito por meio da “promoção da produção e a distribuição de materiais informativos e educativos no âmbito escolar sobre a importância dos princípios e valores fundamentados na palavra de Deus”.
LIBERDADE
O artigo 5º da Constituição Federal Brasileira estabelece, entre outros, o direito à liberdade de crença, e o artigo 19 consagra a laicidade do Estado, proibindo-o de estabelecer culto ou de se associar a práticas religiosas de modo a privilegiar uma fé em detrimento de outras ou mesmo dos que não professam nenhuma.
Neste sentido, a campanha proposta — que envolve a disseminação de ensinamentos bíblicos e o fortalecimento da “identidade cristã” nas escolas públicas — coloca em risco os princípios fundamentais do Estado laico, pois implica uma promoção ativa de valores de uma religião específica em espaços educacionais que, por lei, devem ser neutros e inclusivos.
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É importante considerar que a imposição de um discurso religioso específico nas escolas pode inibir o desenvolvimento da autonomia dos estudantes, que devem ser incentivados a explorar uma gama diversa de perspectivas éticas e culturais. A pluralidade cultural e o diálogo inter-religioso são fundamentais para uma formação integral, que respeita e valoriza as diferenças.
A tentativa de contrastar Halloween com os “ensinamentos bíblicos” proposta pelo deputado evangélico parece partir de uma visão distorcida da celebração, reforçando estereótipos que associam a festividade ao sobrenatural negativo, desrespeitando o direito dos indivíduos de se engajarem em tradições e práticas culturais diversas.
Para além da questão religiosa, cabe questionar a quem serve tal proposta e quais valores estão realmente sendo promovidos. Em um país onde o Estado deveria atuar para garantir os direitos de todos, independente de fé ou crença, o uso de campanhas religiosas em espaços públicos levanta a suspeita de que há uma agenda de valorização e favorecimento de uma única visão de mundo.