“Como cobrir a Amazônia em segurança: protegendo jornalistas e fontes” foi o tema da primeira participação da CENARIUM no 20º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). O evento ocorre de quinta-feira, 10, a domingo, 13, no campus Álvaro Alvim da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), em São Paulo. A rede de comunicação é sediada em Manaus (AM) e conta com profissionais nas principais cidades da Amazônia brasileira.
A fundadora da CENARIUM, jornalista e mestre em Sociedade e Cultura da Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Paula Litaiff, foi uma das palestrantes do evento que abriu o primeiro dia de debates do congresso, que conta com a presença de profissionais do Brasil e de outros países. A atividade, que debateu a cobertura na Amazônia, também teve a participação da jornalista Steffanie Schmidt, do site O Varadouro. O debate foi mediado pelo jornalista Daniel Camargos, repórter especial na Repórter Brasil e colunista na Carta Capital.
Durante o evento, Paula Litaiff pontuou que os desafios para a cobertura jornalística na Amazônia ganham contornos ainda mais complexos pelo crescimento exponencial da onda de violência contra ativistas e profissionais que cobrem a região, e destacou os protocolos de segurança adotados pela CENARIUM. Durante as atividades, a jornalista também apontou problemas como a baixa cobertura de internet na região e a falha na segurança estatal para garantir a proteção do cidadão que vive nos territórios alvo dos conflitos.
“O primeiro protocolo criado pela CENARIUM trata de evitar ambientes fechados e isolados junto a personagens que já foram alvos de investigação jornalística de profissionais que atuam na rede. Isso ocorreu após uma experiência minha, como repórter, quando fui agredida com outro colega na cobertura de um político que, em 2009, foi alvo de apuração. Na sequência, essas medidas foram sendo aprimoradas para que o repórter esteja seguro no exercício da sua profissão, que assegura o direito constitucional de todos os cidadãos de ter acesso à informação”, disse Litaiff.
De acordo com Litaiff, o jornalista que investiga o crime organizado na Amazônia também deve ter o cuidado de avaliar a relação entre a população local e as autoridades que estão no poder na região. Entre os cases apresentados para exemplificar a segurança dos profissionais, a fundadora da CENARIUM mostrou reportagens do veículo em áreas de conflitos, como “Vale do Madeira: Rio da Morte”, que reportou o massacre do Rio Abacaxis, no Amazonas, e “O gás que sufoca na Amazônia”, que revelou como a empresa Eneva S.A. descumpriu protocolos internacionais, segundo lideranças indígenas locais e o Ministério Público Federal (MPF), para explorar gás na região de Silves (AM).
“Um dos protocolos mais importantes está na definição dos integrantes da equipe de reportagem que vai a campo, porque, hoje, eu entendo, como gestora, que a rede de comunicação não pode mandar alguém que entrou no jornalismo, que iniciou a carreira agora, para um território de conflito. Podemos avaliar, até para que o profissional tenha a experiência, mas junto com ele irá um repórter e fotojornalista com pelo menos dez ou vinte anos atuando na área. Para os territórios mencionados, além dos profissionais da comunicação, foi contratado um segurança privado para garantir que eles estavam seguros”, pontuou.
A jornalista Steffanie Schmidt, que atua no site O Varadouro, também falou sobre como garantir a segurança dos profissionais que cobrem a região da Amazônia brasileira. Para ela, ao longo dos últimos anos houve uma mudança na dinâmica de violência contra os profissionais que atuam em investigações contra grupos envolvidos em atividades ilegais dentro dos territórios, e mencionou que esses casos foram impulsionados sob a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019–2022), que foi um político hostil ao jornalismo.
“A gente vê mudanças na dinâmica de relação de violência dentro dos territórios, principalmente impulsionadas pelas ações do governo Bolsonaro. E isso torna a adoção de protocolos de segurança ainda mais importante, além da colaboração dos profissionais para a troca de experiências. Não temos uma receita de bolo, mas precisamos dar passos mínimos para garantir a segurança tanto do profissional quanto da fonte. Então, devemos ter um jornalismo responsável que não ignore esses fatos“, declarou.
Liderança indígena reforça o jornalismo
A mesa de debate, que contou com a participação da fundadora da CENARIUM, teve a presença, na plateia, da liderança indígena do Vale do Javari (AM), Beto Marubo. Durante os debates, ele reafirmou a importância da valorização do jornalismo local na cobertura da Amazônia em diferentes aspectos. Para Marubo, os profissionais que estão na região são mais familiarizados com os temas que são levantados, e isso permite maior precisão na transmissão da informação sobre o que acontece nos territórios. Citando o caso Bruno e Dom, o líder indígena apontou, ainda, que o caso só ganhou a proporção que deveria graças ao jornalismo.
“Valorizem os comunicadores locais. Isso é fundamental porque é quem está ali e sabe da dinâmica. Naquele momento, falando sobre o caso Bruno e Dom, a única forma de a gente mobilizar as autoridades foi através por meio do jornalismo. Acionamos a rede de comunicadores e, em seguida, entraram jornalistas como a Sônia Bridi, a Paula Litaiff. Ou seja, em uma semana, chegaram jornalistas do mundo inteiro a Atalaia do Norte (AM), o que permitiu uma mudança. Inicialmente, as autoridades, na figura do presidente Jair Bolsonaro (PL), afirmavam que Bruno e Dom eram um bando de irresponsáveis. Quando a porrada começou a acontecer e pegaram eles em Nova York, eles começaram a mudar. Isso foi graças ao jornalismo”, declarou.
Fotojornalismo na Amazônia
A CENARIUM também participou de outro debate que abordou o tema “Cobrindo a crise climática com fotojornalismo e audiovisual”. A atividade foi mediada pelo fotojornalista Ricardo Oliveira, com a participação de Michael Kodas, editor sênior da Inside Climate News e conselheiro da Society of Environmental Journalists; da uruguaia Mariana Greif, fotógrafa documental e videomaker; e de Takumã Kuikuro, cineasta.
Oliveira classificou o evento como dinâmico e pedagógico ao mostrar aos participantes as formas de registrar a realidade da região, que passa por um momento nunca visto em relação aos impactos das mudanças climáticas.
“A primeira rodada de debates foi muito produtiva e pedagógica, porque tivemos a participação de profissionais que estão familiarizados com a pauta ambiental. Os três possuem grandes cases de sucesso e o debate ocorreu de uma forma que a plateia pudesse compreender todas as nuances do que é cobrir um momento delicado na história da humanidade”, declarou.
VIA REVISTA CENARIUM